Por Rudmar Luiz Pereira dos Santos* 

 

Com a iminente entronização do PMDB no governo federal, as palavras de ordem que soam como música para o deleite de seu sócio de governo, ou seja, o mercado neoliberal, são dirigidas às “prementes reformas” que "objetivam" o controle da dívida pública, reequilíbrio das contas do Tesouro, "que passam" por prementes mudanças na Constituição (a chamada "Constituição Cidadã"), aumento de tributos, supressão de direitos previdenciários e trabalhistas, etc. Esse é o mote que se avizinha no horizonte: "prementes reformas" regadas ao estado mínimo, supressão de direitos trabalhistas e previdenciários, "explicitação máxima" das PPPs - Parcerias Público-Privadas, concessões, privatizações, etc. A própria imprensa oferece claros sinais dessa tendência "reformista":

24/04/2016 - Folha de S. Paulo & Dívida pública é bomba-relógio que cresce cerda de R$ 2 bilhões por dia "O reequilíbrio das contas do Tesouro depende de aumento de tributos ou reformas impopulares que reduzam direitos previdenciários e trabalhistas. E essas reformas exigem mudanças na Constituição, para as quais é preciso ter votos de 60% do Congresso - particularmente difícil em ano de Olimpíada e eleições." (Grifamos)

 

24/04/2016 - Folha de S. Paulo & Temer usa concessões e parcerias público-privadas para atrair empresariado "Governo S. A. O empresariado tem escudado como música os sinais de como se comportaria uma eventual gestão Temer em relação ao setor produtivo. Nas conversas com representantes do PIB, peemedebistas capitaneados por Romero Jucá vêm repetindo que a saída para a crise econômica passa pela explicitação máxima das concessões e das parcerias público-privadas. Uma das críticas ao governo Dilma Rousseff eram as amarras em regras das concessões, com o que o peemedebista promete acabar." (Grifamos)

 

24/04/2016 - Folha de S. Paulo & Temer será de fato "Ponte para o Futuro"? "Ou seja, é necessário combinar com os russos. É por esse motivo que acredito que a maior probabilidade é o governo Temer reproduzir o período Levy: conforme o mercado perceber que não há bala na agulha para aprovar no Congresso Nacional as medidas que encaminham solução para nosso gravíssimo desequilíbrio fiscal estrutural, o risco-país e o câmbio voltarão a serem pressionados e as expectativas de inflação deixam de ceder. O ajuste cíclico novamente desanda."

 

20/04/2016 - Folha de S. Paulo & E agora, Michel? "Em contraste, hoje o orçamento federal se encontra ainda mais engessado, com mais de 90% das despesas já devidamente contratadas antes do começo do ano fiscal, enquanto o espaço para aumento das receitas é muito menor do que no passado. Não há saída convencional para o problema que não passe, portanto, por reformas profundas, da questão previdenciária (idade mínima, regimes especiais, etc.) às vinculações orçamentárias, todas da alçada do Congresso Nacional. À parte essa tarefa, por si gigantesca, há ainda muito que reformar no país. Uma lista (incompleta) incluiria: a) mudanças trabalhistas, permitindo que acordos voluntários entre as partes se sobrepusessem à lei;" (Grifamos)

 

Sobre as PPPs 

O regime jurídico das parcerias público-privadas é um só, mas seu objeto, ou área de aplicação da atividade pública, é múltiplo. A Lei nº 11.079/2004 (art. 4º, III), que “institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração pública”, não obstante à multiplicidade, não permite que as PPPs “avancem” sobre a indelegabilidade das funções de regulação.

A legislação citada procurou inspirar-se na experiência estrangeira de países, como Espanha, Portugal e Inglaterra. Os britânicos têm experiência maior no campo das PPPs, tanto que especialistas em PPPs daquele país – PFIs, Project Finance Initiatives – assessoraram o governo Lula durante a tramitação da Lei nº 11.079/2004 no Congresso Nacional.

A motivação para a criação das PPPs foi a de que o Estado brasileiro “não dispõe de recursos para grandes investimentos na área pública. Não conta com caixa para projetos de infraestrutura tão necessários para o crescimento da economia brasileira e para os grandes projetos e investimentos na área social”.

 

As PPPs trazem em seu bojo críticos problemas: 

1 - Criação de demasiadas facilidades para o capital privado 

O primeiro deles é que a ideia de PPP, consubstanciada na Lei nº 11.079/2004, cria demasiadas facilidades para o capital privado. Sua linha geral é velha conhecida nossa dos anos FHC, seja nas privatizações, seja na legislação das concessões e outros tipos de vínculos Estado-setor privado: privatização dos lucros e estatização dos prejuízos. 

 

2 - As PPPs favorecem a uma política pública focal 

Ora, se o critério essencial do capital é o lucro, a obra das PPPs ganha um caráter não mais universal, mas de obra dirigida a focos ou áreas mais lucrativas, ali onde a parceria for boa para o setor privado. 

 

3 - A mercantilização dos serviços públicos 

As PPPs representam a mercantilização de áreas que antes eram serviços públicos, de Estado. Praticamente só ficam de fora das PPPs a função legislativa, judicial, policial e de regulação. O resto pode ser alvo do lucro privado, pode virar mercadoria. Daí porque estabelece o multicitado art. 4º da Lei nº 11.079/2004: Na contratação de parceria público-privada serão observadas as seguintes diretrizes (...) III – indelegabilidade das funções de regulação, jurisdicional, do exercício do poder de polícia e de outras atividades exclusivas do Estado. Todavia, o que serão estas outras atividades exclusivas do Estado? Quem diz o que é serviço público? Qual o critério para se afirmar que um serviço é público ou não é? Quais os serviços que podem ser delegados?

É fato notório ao estudioso do Direito Administrativo a polêmica, ainda insolúvel até os dias de hoje, sobre o conceito de serviço público. O entendimento será aquele predominante em nossa época, de um Estado mínimo, do tipo: não será delegada a função de defesa (exército, marinha, aeronáutica) ou de expedição de moeda? E a função do banco central? Qual será o critério para a definição?

Sabemos, por experiência histórica, o quanto a experiência da mercantilização da saúde foi negativa para o povo brasileiro, pelo menos para sua maioria mais pobre. Agora as PPPs vão implantar esse processo no tratamento e distribuição da água, no tratamento de esgoto, na vaga da penitenciária e no direito de circulação pelas estradas, afora outras áreas constitucionalmente ou que estão infraconstitucionalmente atribuídas ao Poder Público. 

 

4 - A ciranda financeira e o endividamento 

Por fim, a rendição à iniciativa privada que está no corpo da lei das PPPs traduz bem aquela linha do Estado mínimo e da cidadania mínima e sempre em nome de atrair capital privado ocioso, torná-lo lucrativo. Essa é a essência da redefinição do Estado brasileiro, agora tornado um Estado rentista, a serviço da acumulação financeirizada do capital. 

 

5 - Comprometimento do princípio maior do serviço público 

O segundo problema é que, da forma como está, a lei das PPPs compromete a própria essência daquilo que norteia o serviço público, o que seja, o princípio do interesse público.

 

Os serviços oficiais de defesa agropecuária tutelados pelo Estado

A tônica disseminada pelo novo governo que se avizinha é a “explicitação máxima” das parcerias público-privadas (PPPs), ou seja, mais problemas à vista. 

Porém, antes mesmo da “explicitação máxima" das PPPs, a nefasta privatização já chegou à (in)defesa agropecuária deste maltratado estado pelas mãos das malfadadas portarias 39/2015 e, sobretudo, 158/2014 [fora a possível precarização  promovida pela 76/2015]. A privatização em detrimento do interesse público em defesa agropecuária, deu-se à revelia do Direito Administrativo que tem como princípio básico o da legalidade, conforme art. 37, caput, CRFB/1988, o qual determina que, como já ensinava o saudoso professor Hely Lopes Meirelles [MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 21. ed. (atual. Eurico Azevedo et al.). São Paulo: Malheiros, 1996, p. 82.]: “enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza”, ou seja, não encontra amparo no Decreto nº 5.741/2006.

Ante ao pecaminoso descompromisso das (sic) autoridades públicas em turno com o interesse público, compete à categoria dos fiscais da defesa agropecuária de boa-fé, unidos e organizados em torno da sua associação de classe, reagir contra a intromissão indevida das PPPs, privatização, terceirização, precarização etc. em prejuízo da defesa agropecuária tutelada pelo Estado. Está em jogo o futuro da categoria traduzido por dignidade, respeito, valorização profissional e justiça remuneratória.

Fonte: https://goo.gl/Kiq5Ef

 

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* Presidente da Afisa-PR durante o triênio 2015/2018